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terça-feira, 14 de março de 2017

Pedro Mastrobuono II


SEGUNDA pergunta para Pedro Mastrobuono. Vale ressaltar a citação a Ladi Biezus, nosso primeiro entrevistado. Cutura e Sensibilidade através de gerações...
PERGUNTA: Seu pai, além de engenheiro de grande capacidade, foi intelectual com pensamento independente, sempre surpreendente, e superior domínio da expressão verbal. A nosso ver, avesso aos cerebralismo gratuitos, preferiu artistas da cor, com produção numerosa, pois entendia que o verdadeiro artista tem necessidade de criar: Volpi, José Antonio da Silva, Pancetti. Reconheceu a arte do equatoriano Oswaldo Guayasamín antes que ele se tornasse mundialmente famoso como pintor latino-americano. Qual o papel de seu pai em seu interesse e conhecimento em artes ?
RESPOSTA:
Ninguém convive por meio século com Marco Antonio Mastrobuono impunemente. Impossível.
Levando-me pela mão, desde a mais tenra infância, fez-me presenciar infindáveis conversas e reflexões. Nunca se fez rodear por medíocres, sobre os quais pudesse ter algum controle ou ascendência. Dizia que isso era conduta de covardes e inseguros. Conviveu com gênios, com gigantes. Não só nas artes. Extraindo todo o conhecimento possível. 
Minha prudência sempre esbarrava em seu arrojo. Como muito bom enxadrista que era, ralhava comigo repetindo incontáveis vezes, até os últimos dias: “Deixe de jogar com as pretas! Pense com as brancas!”.
Foi alfabetizado, simultaneamente, em francês. Ainda bem pequenininho, meu avô lia para ele, todo santo dia, alguma das fábulas de La Fontaine. Depois, os dois discutiam seu conteúdo e significado. Tudo naquela língua. Meu pai desenvolveu um humor refinado e certo apego por imagens poéticas.
O que dizer do convívio com pessoas como Alfredo Volpi, Theon Spanudis e Oscar Niemeyer? Para mim era puro fascínio. Inebriante. Na casa de minha infância, era comum encontrar ainda Willys de Castro, Hércules Barsotti e tantos outros. Domingos Giobbi foi até passar uma temporada conosco, quando residíamos no Perú. Ladi Biezus é meu padrinho de Batismo e de Crisma de meu irmão, duplamente compadre de meu pai.
Minha casa, embora muito concorrida, não era o único cenário para esses intensos “cafés filosóficos” sobre arte e cultura. Sábado era dia obrigatório de visita ao ateliê de Volpi. Todos lá novamente.
Ladi, por exemplo, almoçava conosco aos Domingos, quase religiosamente. 
Por tudo isso, não sou capaz de traduzir, de modo honesto, a quantidade de horas de conversas que presenciei.
Ao logo de toda uma vida, quando algum marchand nos visitava, especialmente quando trazia um Volpi em suas mãos, meu pai mandava me chamar e ficava calado. Prestava muitíssima atenção de como eu manuseava o quadro, na expetativa de que eu me lembrasse de primeiro analisar o verso da obra, ver como a tela era fixada (se com grampos ou por tachinhas), sem ter ainda olhado sua parte frontal. Gostava e sorria, quando eu passava a mão sobre a pintura, para reconhecer a inconfundível textura da têmpera. Dizia que eu havia sido alfabetizado em Volpi e que seria eu a falar de que época era tal pintura, cobrando o porquê de minhas conclusões. Caso não fosse autêntico, quais as inconsistências. Não é difícil imaginar, quantas e quantas vezes, fiquei constr angido. 
Meu pai era todo humano. Apaixonado por Tango, sabia inúmeros de cor, com diversos livros de letras das músicas em sua biblioteca. Lia metros cúbicos. Foi poeta, sendo que estamos agora compilando e trabalhando na publicação de suas obras.
O papel de meu pai no meu interesse por arte é, irrefutavelmente, direto. Muito daquilo que penso, são reminiscências. Já outras coisas, sequer são meras recordações fragmentadas. Alguns conceitos e reflexões ficaram gravados, de modo indelével. É como se eu o tivesse engolido e ele continuasse falando dentro de mim.

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