tinha uma foto que durante muito tempo acompanhou o neto curioso.
sempre quis saber de onde era...
Há mais de 20 anos, quando eu li os livros “As brumas de Avalon”, que se passam na idade média, me chamou muito a atenção o quanto as pessoas e, em especial, as mulheres, eram mais conectadas com os ciclos da natureza e com os seus próprios ciclos naquele tempo, o que eu não percebia nas pessoas, no momento em que os li. Percebo que a desconexão tem se tornado ainda maior na atualidade.
O desenvolvimento tecnológico e científico tem trazido enormes benefícios a todos nós, mas também tem nos apartado muito da natureza. Da nossa própria natureza em especial.
Tenho observado que tem havido cada vez mais a necessidade de anestesiar-se, evitar sentir. Se por um lado parece bom, pois as pessoas podem esquivar-se das dores, as coisas boas também são evitadas, pois não é possível anestesiar-se só para coisas aparentemente ‘ruins’. Não cabe a mim julgar ninguém, suas escolhas e possibilidades, mas gostaria de levantar alguns questionamentos e cada um poderá refletir se faz ou não sentido para si.
As mulheres, por exemplo, podem escolher o tipo de parto que desejam, já na primeira consulta de pré-natal, sendo que muitas delas não querem nem saber de parir naturalmente, já deixando agendada a cirurgia. Evitam-se as dores do parto, mas em compensação há a dor do pós-cirúrgico, a demora na descida do leite e também a falta de esforço do bebê em atravessar o canal do parto. Não acho que a cesariana seja ruim, de forma alguma, mas acho que ela deve ser usada com critério, quando for realmente necessária.
Também há mulheres que já escolhem nem menstruar mais, afastando-se assim dos seus próprios ciclos. Eu não considero a menstruação a coisa mais agradável do mundo, aliás algumas vezes sofro com cólicas, tpm, acidentes de percurso, mas entendo que viver esse ciclo seja importante para a fêmea que sou. Aqui nesse exemplo eu não desconsidero as doenças como a endometriose, em que a mulher precisa realmente evitar menstruar, mas falo da escolha pela ausência de desconforto pura e simples.
Cito esses dois casos, mas existem muitos. As drogas (lícitas ou não), que servem para anestesiar das dores emocionais, de casamentos falidos, de vidas sem propósito, de profissões que não satisfazem, da imensa dificuldade em promover mudanças na própria vida. A falta de aprofundamento nas relações humanas de modo geral. A busca desenfreada pelos bens materiais, como se eles preenchessem a falta de valor que se tem na essência. E muitas outras coisas.
Na vida há ciclos. Ciclos de vivenciar perdas, de recolhimento, de se abrir para a florescência e também de deixar brilhar a nossa luz. Sim, todos temos luz! Não apenas no sentido figurado, mas literalmente, em nossas células há biofotons que emitem luz, embora não seja vista pelo olho humano, mas detectável por aparelhos especiais, como a foto Kirlian, mas esse é assunto para outro artigo. E para que nossa luz possa brilhar com intensidade, precisamos viver os nossos ciclos.
Na semana passada teve início o inverno para nós do hemisfério sul. Eu, particularmente, não gosto dessa estação. Mas de tanto reclamar do frio, da falta de sol cedo pela manhã, da minha baixa energia nessa época do ano, me coloquei a pensar no que isso significa para mim. E vi que não estava me dobrando aos ciclos. Que embora eu ame a primavera, é preciso viver verdadeiramente o inverno para que quando a primavera chegar me encontre pronta para florescer.
E o que significa viver os ciclos? É permitir se adaptar a cada momento da vida. É não se anestesiar para deixar de sentir o que precisa ser sentido. As dores não devem ser varridas para baixo do tapete. Dor tem que ser reconhecida, vivida, chorada. É natural se recolher em um momento de dor. Se fazemos um esforço para não deixar doer, em algum momento no futuro, teremos problemas físicos e/ou emocionais que acabarão nos obrigando ao recolhimento. Eu costumo dizer que as dores são como fermento. A gente deixa pra lá, achando que vai ficar quietinha, sem incomodar, mas basta uma gota de água, ou uma lágrima para que ela aumente de tamanho e se expanda além do que era preciso, algumas vezes tomando conta de todo nosso ser. Não estou dizendo que a gente deve viver eternamente na dor, ao contrário. Mas se a dor for vivenciada como deveria, com algum tempo teremos recuperado as forças para seguir nossa trajetória sem ela.
E assim é com todos os sentimentos, com tudo que a vida nos traz. Se for tempo de outono, permita-se perder algumas folhas, ou até melhor, desfaça-se do que já não lhe serve mais. Isso vale para objetos (doações fazem um bem enorme para a nossa energia!) e sentimentos. É renovador jogar fora mágoas, hábitos que já não fazem sentido, reciclar relações. Se o inverno chegar, recolha-se, procure ficar mais tempo consigo mesmo, conhecer os seus lados mais frios, mais escuros, mais assustadores. É um ótimo tempo para o autoconhecimento. Quando for a primavera, deixe florir! Saia espalhando pelo mundo o que você tem de melhor, deixe cores, aromas e beleza por onde passar, sinta a vida pulsando intensamente em você. E no verão, viva o calor, a luminosidade, a alegria de partilhar com muitas pessoas.
Os nossos ciclos internos podem ou não coincidir com os da natureza. Podemos estar em pleno inverno interior quando lá fora pulsa o verão e não há nada de errado nisso. Se respeitamos a nós mesmos, não nos obrigando a ser e viver o que não estamos conseguindo naquele momento, está tudo bem, tudo como deveria ser.
Enfim, sugiro que você reflita sobre seus ciclos, que você se questione se tem vivido cada tempo da vida como deveria, se tem sentido “a dor e a delícia de ser o que é”, como na linda música de Caetano Veloso, Dom de iludir.
Eu adoraria saber sua opinião sobre esse artigo. Quero saber se você discorda, se concorda, se quer compartilhar algo que tenha a ver com ele, se quer sugerir a leitura dele a alguém.
Eu já havia terminado de escrever esse artigo quando fui ao cinema assistir “Divertida mente”. E acho que o filme tem tudo a ver com o que eu falo aqui. Se você puder, assista, é muito interessante. E não tenha preconceito por ser uma animação, os filmes aparentemente infantis podem trazer ensinamentos muito adultos.
Agradeço muito a sua companhia aqui.